Ela sempre dizia, quando se encontrava para colocar os assuntos em dia, que a cevada de abóbora era uma das melhores que havia degustado. Ele não apreciava cevada, mas tentava conhecer, aos poucos, o porquê as pessoas gostarem tanto desse tal líquido. Ela era extrovertida, sempre se reunia com os amigos, a cevada, sempre presente, despertava os ânimos silenciados. Ele não estava para o mundo externo, era mais quieto do que o silêncio de uma orquestra sinfônica, permitia-se a experienciar novos sabores e saberes, mas não entendia o motivo das pessoas se reunirem e exaltarem a cevada. Ela era atraente, charmosa. Ele, simples, pouco vaidoso, usava as mesmas roupas há anos. Ela era altruísta. Ele, um buscador nato pelo autoconhecimento. Ela gostava de dançar para se libertar dos problemas e dificuldades da vida, da semana… Ele sumia em sua magrela mundo a fora para apreciar novas paisagens que havia em seu âmago. Certa vez, Ele encontrou a cevada aboborada, veio, em sua mente, inúmeras lembranças do passado, do tempo que estivera juntos. Permitiu levar-se pela sensibilidade que despertava profunda saudade. Disse: “Moço, quanto tá essa de abóbora?” “Nove reais, jovem.” “Então vou levar.” Ela não estava mais presente, havia deixado Ele há meses, foi embora, levou consigo todas as fotos, cartas, lembranças. Colocou tudo na bagagem do coração e foi… rumo ao desconhecido, ao plano metafísico. Ele, agora, levou a cevada no epitáfio, onde Ela deixou o último show da existência humana em solo terrestre. Ele abriu a cevada, regou as flores em volta do local, pois as lágrimas haviam secadas há tempos… E todos os dias, após a chegada da partida Dela, Ele levou a cevada para regar o solo sagrado de seu ex-amor com cevadas de abóboras.
(Imagem retirada da internet)
São Bernardo do Campo, Inverno de 2018.
Matheus Pensador.